Itaguaí: CPI sobre ameaças ao presidente da Câmara tem seu primeiro depoimento
Depois de cerca de 40 minutos de atraso e problemas técnicos, as sessões das Comissões Parlamentares de Inquérito aconteceram na sexta-feira (18) na Câmara Municipal de Itaguaí (CMI). A CPI 001/2022 investiga o contexto de uma carta entregue pessoalmente na sede da Câmara e endereçada ao presidente da Casa, vereador Gil Torres (PSL). A carta o vincula ao comando da Polícia Militar que efetuou ações contra o tráfico na localidade conhecida como Sem Terra. A CPI 002/2022 investiga o roubo de notebooks comprados pela prefeitura para atender à secretaria municipal de Educação.
ENTENDA AQUI A CRIAÇÃO DAS CPIS: https://jornalatual.com.br/carta-misteriosa-e-roubo-de-notebooks-motivam-criacao-de-cpis-na-camara/
VEJA AQUI O PRIMEIRO DEPOIMENTO DA CPI 001, SOBRE AMEAÇAS AO PRESIDENTE GIL TORRES: https://www.facebook.com/watch/live/?ref=watch_permalink&v=897559650915105
A sessão da CPI 001 ouviu o Capitão André Luis Araújo Monteiro, da 5ª Companhia (24º Batalhão da Polícia Militar). A 5ª Companhia é responsável pelo policiamento em Itaguaí.
A sessão da CPI 002 não ouviu ninguém. O depoente convocado, Ricardo Oliveira, enviou um comunicado à comissão informando sua impossibilidade de comparecer.
DIVULGAÇÃO INEFICIENTE
Ambas as CPIs têm sido ineficazes no sentido de comunicar suas decisões e oferecer uma visão mais clara dos trabalhos de investigação. Apesar do presidente Gil Torres deixar claro que a Câmara vai transmitir os depoimentos em rede social da CMI, isto não é o suficiente: há muitas dúvidas sobre as decisões das comissões e de como as investigações vão transcorrer.
O ATUAL solicitou entrevista aos presidentes das CPIs, vereadores Vinícius Alves (CPI 001) e Haroldo Jesus (CPI 002), mas até o momento não obteve resposta.
Em relação à CPI 001, não ficou claro o motivo da convocação do Capitão André Luis Araújo Monteiro, e o que se buscava saber a partir do seu depoimento.
Ainda sobre a CPI 001, cabe a pergunta: por que não começar a investigação pela autoria da carta que o presidente Gil Torres recebeu? Quem foi a pessoa que a entregou na sede da Câmara? As câmeras de vigilância captaram a imagem desta pessoa? Ela se identificou na recepção?
Como a carta parece ter sido o estopim para a criação da CPI, o primeiro depoimento deixa margem para que se pense que os vereadores descartaram essa linha de investigação.
Da mesma forma, não se sabe quem é Ricardo Oliveira, e qual é o objetivo da sua convocação na CPI 002.
Também não há informações sobre quem são os convocados a prestar depoimentos ou quaisquer outras ações, diligências ou pedidos de documentação.
As comissões parlamentares de inquérito precisam produzir informes e atender à imprensa nas suas demandas, sob o risco de abalar a transparência da qual o presidente Gil Torres faz questão de garantir.
Planejar a relação com a imprensa para atendimento das demandas específicas das CPIs torna-se cada vez mais urgente, sob o risco das investigações transcorrerem sem que haja a necessária publicidade dos atos de órgão público, o que, sem dúvida, é o caso da Câmara de Vereadores de Itaguaí.
O DEPOIMENTO DO CAPITÃO
O presidente da comissão 001, vereador Vinícius Alves (Republicanos), realizou seis perguntas iniciais ao Capitão André Luis Araújo Monteiro, que foi o comandante da 5ª Companhia do 24º BPM, responsável pelo policiamento em Itaguaí, de setembro de 2021 a fevereiro de 2022.
O Relator, vereador Alex Alves (PRTB), fez três. O membro Jocimar do cartório (PTC), duas. Ao fim, o presidente da comissão finalizou com mais seis perguntas, totalizando 17 questionamentos.
A ação propriamente dita só começou depois de 40 minutos do início da transmissão. Não bastasse o atraso, depois de começada a sessão ela foi subitamente interrompida por problemas técnicos. Segundo texto publicado no site da CMI, o motivo foi a perda de sinal de internet no plenário.
Cabe um parêntese: os problemas técnicos nas transmissões da Câmara em Itaguaí só não são mais frequentes do que a má qualidade das imagens e do áudio. Em suma: o serviço que se presta atualmente é falho, ruim, e dificulta a participação popular.
A pedido do presidente Gil Torres, que acompanhava o depoimento, a oitiva foi interrompida para que o interrogatório fosse transmitido na íntegra com o restabelecimento da conexão com a internet.
De qualquer maneira, o ATUAL acompanhou o depoimento que foi interrompido e, tanto nesta primeira parte quanto na segunda, o Capitão deixou claro que no Sem Terra não houve uma ocupação, mas sim uma intensificação do policiamento porque na área havia aumentado o número de roubos de veículos e assaltos. Neste período, ele disse que contou apenas com uma viatura e dois homens, que se revezavam, e que isso não configura uma operação policial, que precisa, obrigatoriamente, de autorizações de várias instâncias.
De forma geral, o Capitão André Luis Araújo Monteiro respondeu sobre como procedeu em função do boato que circulava entre moradores e policiais: o de que o vereador Gil Torres teria proferido ordens à PM nas ações realizadas na localidade Sem Terra. Em um termo que ele protocolou na 50ª DP em 25 de novembro do ano passado, ele relatou que ouviu de policiais que o chefe do tráfico no Sem Terra, vulgo Café, teria ameaçado Gil Torres, responsabilizando-a pela permanência da polícia no local.
A carta recebida por Torres tem como teor uma suposta moradora que pedia ao vereador para retirar a PM do local, pois os agentes estariam “esculachando moradores”.
O Capitão também disse que não havia materialidade no que estavam dizendo a respeito do assunto, e que mesmo assim pediu aos agentes que se mantivessem atentos a quaisquer movimentações. Pediu também que o presidente Gil Torres fosse avisado a respeito por um dos seus seguranças, que também é policial, chamado Maxwell.
Segundo o Capitão, houve uma conversa entre ele, Gil e o delegado Marcos Castro sobre o assunto. André Monteiro protocolou um termo na delegacia para registrar que tomou conhecimento do boato que circulava entre os policiais, a fim de oficializar que havia avisado a respeito ao presidente e ao delegado. Ele também avisou ao comandante do 24º BPM e disse que colocou policiais e viaturas à disposição do presidente Gil Torres.
O Capitão disse que se dirigiu ao presidente da seguinte maneira: “Gil, sentiu ameaça de qualquer coisa, tem uma viatura à sua disposição, tiro de qualquer lugar e mando para você ou para a sua família”. Segundo ele, essa atitude foi coerente com um sentimento de gratidão ao vereador: “Sempre que precisei de alguma coisa referente a serviço, como por exemplo máquinas para retirada de barricadas, o vereador ajudou. Então, não posso ser ingrato. Por mais que seja boato, a gente se coloca à disposição”, afirmou ele, que acrescentou: “O próprio comandante do Batalhão disse que eu fizesse dessa maneira”.
André Monteiro enfatizou que o boato envolvendo o nome do vereador não tinha materialidade, que foi algo de se ouvir dizer, sem qualquer consistência.
Sobre a diferença entre ocupação e intensificação do policiamento no Sem Terra, o Capitão disse: “A gente tinha uma viatura lá dentro. Uma viatura não ocupa lugar nenhum. Ocupa muito mal a frente aqui da Câmara”. André informou que a intensificação do policiamento começou em 12 de novembro de 2021 e terminou em dezembro.
Segundo ele, o objetivo era reduzir os índices de criminalidade no Sem Terra e no bairro Vila Margarida. O Capitão mencionou as disputas entre facções de traficantes no local que acabaram por ocasionar homicídios, e as dificuldades no enfrentamento deste contexto, que inclui milicianos como outros agentes fora-da-lei que precisaram ser combatidos.
Ele também se referiu a problemas na área por conta de ocupações do terreno da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e das demandas de segurança do gabinete itinerante do vereador Gil Torres. No caso da CSN, houve inclusive ordem judicial para reaver a propriedade.
O Capitão disse que as ordens de intensificação e de término dessas ações foram dadas pelo comandante do 24º BPM, Coronel André, e que as condições de atuação da PM no município são muito desfavoráveis: “A cidade cresce e o número de policiais diminui. Já tive 100 homens sob o meu comando em Itaguaí, hoje são apenas 70”.
MAXWELL
O soldado da PM conhecido como Maxwell foi citado pelo Capitão como segurança do presidente Gil Torres. Segundo o depoimento, foi a ele que o Capitão pediu que avisasse Gil Torres sobre o boato.
O presidente da CPI, Vinícius Alves, perguntou então como o policial sabia que Maxwell era segurança de Torres. Ele respondeu: “Ele mesmo fala [que é segurança], mas se ele é mesmo eu realmente não sei, mas é o que ele fala, é o que todos falam, mas eu não procuro saber da vida particular de nenhum policial meu, a menos que chegue alguma denúncia de crime”. André Monteiro confirmou que o soldado esteve sob o seu comando, e complementou: “que fique registrado, é um excelente policial”.
O encontro entre o Capitão, Gil Torres e o delegado Marcos Castro para conversar a respeito dos boatos e das ameaças teria ocorrido depois.
“Em nenhum momento houve pedido de vereador para que eu entrasse [no Sem Terra], os critérios foram técnicos, para reduzir os crimes no local”, disse o Capitão, que deixou claro: “Não sei porque disseram que o vereador Gil Torres teria algo a ver com as ações da polícia no Sem Terra”.
GIL TORRES FAZ PERGUNTAS
O presidente da CMI, Gil Torres, foi à tribuna para fazer perguntas ao depoente e disse que não se sente seguro por causa das supostas ameaças. Ele lembrou que já foi policial e honrou a farda, e também elogiou a PMERJ e a Polícia Civil.
Em seguida, perguntou ao Capitão se ele se sentiria ameaçado, dado o contexto em que a CPI foi originada, ou seja, se os boatos de ameaça à vida de Gil tivessem sido contra o Capitão, como ele se sentiria.
A resposta foi essa: “Entendo a sua posição, mas há ameaças concretas contra a minha vida feitas pela milícia, e nem por isso estou implicando por estarem transmitindo a minha imagem, faz parte da vida de uma pessoa pública. Como policial, ser ameaçado é corriqueiro. Sempre deixei claro que o vereador Gil Torres nunca teve nada a ver com isso”, afirmou o Capitão, e reiterou que os critérios de ação no Sem Terra foram técnicos e que tiveram como objetivo diminuir roubos no local.
Gil Torres quis saber porque a intensificação do policiamento foi retirada, e o Capitão respondeu que teve que realocar forças policiais para conter a disputa entre facções rivais do tráfico e a ação de milicianos na cidade.
Ao ser perguntado se houve denúncias contra ele na Corregedoria da PM, o policial reiterou que a polícia certamente incomodou os traficantes, e que por esse motivo certamente devem ter feito denúncias. Ele lembrou que, antes mesmo de assumir o comando da 5ª Cia, já havia boatos de que ele havia autorizado os bailes funk na cidade.
Gil perguntou ao Capitão sobre Maxwell, policial apontado como seu segurança, se ele tinha sido orientado a protocolar um termo na 50ª DP a respeito dos boatos. O Capitão disse que sim. Gil Torres, entretanto, não confirmou se Maxwell é ou não seu segurança.
A última pergunta de Torres foi sobre possíveis subornos para retirada de policiamento na cidade, ao que o Capitão negou ter tido conhecimento.
CPI 002: DATA INCERTA
Com a ausência do primeiro depoente, a CPI 002, sobre o roubo dos notebooks da secretaria municipal de Educação, teve um adiamento. O problema é a data. O presidente Haroldo Jesus disse na sessão que remarcou para o dia 27/01, o que causa uma enorme dúvida, pois o mês em curso é fevereiro. Caso se entenda que houve um equívoco de mês, dia 27 de fevereiro é domingo. De qualquer maneira, a data do primeiro depoimento da CPI 002 segue incerta.