“A proteção do trabalhador é um fator econômico nas empresas”
Como acontece com toda pessoa apaixonada pela profissão, é difícil conter o entusiasmo de Patrícia Magali Gonçalves quando o assunto é seu objeto de trabalho. No caso dela, 31 dos 51 anos de idade são de dedicação na área de gestão de segurança do trabalho. A formação dela é extensa: Engenharia de Segurança do Trabalho (Universidade Católica de Petrópolis), Engenharia Civil (Unifoa), Técnico em Meio Ambiente (Colégio Estadual Rondônia) e Técnico em Segurança do Trabalho (ETPC). Apesar das engenharias no currículo, ela se encontrou profissionalmente quando abraçou a vocação pela segurança do trabalho.
O assunto, que nunca foi alvo de muita atenção no contexto empresarial, hoje é motivo de total relevância, principalmente por causa das modificações do e-social do governo federal, que vai cruzar dados e exigir mais cuidado na preparação dos documentos que têm envio obrigatório.
São agora 38 normas estabelecidas e regulamentadas pelo Ministério do Trabalho que abrangem os mais diferentes ramos profissionais. Além das normas, o governo federal também determina envios periódicos de documentação e obriga as empresas a divulgar internamente documentos que especificam os cuidados que os trabalhadores devem ter, além de demais procedimentos em diferentes graus de complexidade.
Patricia atua no sentido de garantir que as empresas cumpram os requisitos, além de instruir sobre quais devem ser as providências a tomar para que a empresa não colabore para que aconteçam acidentes ou até mesmo que os trabalhadores desenvolvam doenças psicossomáticas. Nesse sentido, a consultoria especializada evita surpresas desagradáveis, e, como enfatiza a especialista, prejuízos financeiros.
“Com a mudança na lógica de fiscalização, o empresário vai precisar de muita precaução para não ter que pagar multas vultosas”, explica Patrícia. “Além disso” – acrescenta ela – “tem gente que só de ouvir falar no nome de alguma empresa tem pesadelos com medo de um parente querido se acidentar no serviço”. Essa imagem negativa, claro, não deve ser objetivo de nenhum empreendedor.
Patrícia Magali recentemente se associou a um dos seus agora ex-empregadores para, em sociedade, tocar uma empresa de Volta Redonda que cuida exclusivamente do assunto e que oferece seus serviços em Itaguaí, cidade onde a Gesstra (assim se chama a empresa) fixou uma filial. No dia 21 de março deste ano, para marcar a chegada à cidade, houve um evento aberto em que Patrícia palestrou, no Centro de Treinamento que fica no bairro Parque Independência.
Nesta entrevista exclusiva, ela conta ao ATUAL porque é imprescindível que o empregador saiba a importância dos cuidados com segurança e a saúde do trabalhador. Ela também conta quais são as principais demandas em Itaguaí e revela que até mesmo as questões psicológicas não podem ficar de fora dos debates sobre o assunto.
Por que a segurança do trabalho é um assunto tão importante nas empresas hoje em dia?
PATRÍCIA MAGALI GONÇALVES = Hoje, fazer segurança do trabalho é uma questão de sobrevivência física e econômica da empresa. Não há mais espaço para fazer de conta que se faz segurança, para improviso. É necessário encarar o assunto com seriedade e com método praticado em uma gestão responsável. Proteger o trabalhador é evitar acidentes, e, ao mesmo tempo, é evitar prejuízos e diminuir despesas. É preciso levar em consideração também que quando há muitos acidentes de trabalho há um comprometimento na imagem, na reputação da empresa. É preciso que o empregador proporcione segurança para que o trabalhador se sinta mais seguro e feliz, porque falta de segurança afeta a produtividade dele e a qualidade do seu trabalho. A família do empregador também fica mais tranquila. Algumas empresas provocam arrepios em determinadas famílias quando um parente diz que vai trabalhar lá. É claro que isso não faz bem para as empresas.
Certamente para se estabelecer em Itaguaí a sua empresa realizou estudos. A partir dessa avaliação, qual é a principal demanda de segurança do trabalho na cidade?
PMG = Nós já atuamos com empresas terceirizadas que prestam serviço para algumas indústrias de Itaguaí. Por isso nos concentramos agora no comércio, em empresas de pequeno e médio porte que também têm demandas por segurança do trabalho. Não são só os grandes, como portos e siderúrgicas, que precisam dar atenção a esse assunto. Os pequenos e médios empreendimentos não têm muita familiaridade ou conhecimento sobre a área e estão vulneráveis a vários riscos. Pensem por exemplo em acidentes com panelas de pressão em restaurantes. Há uma enorme demanda por conscientização e várias providências que esses empregadores precisam tomar.
Quais são os principais tipos de acidente que acontecem no comércio?
PMG = Acidentes elétricos, incêndios e quedas. Há alguns fatores que não são exatamente acidentes, como por exemplo questões ergonômicas (a postura do trabalhador durante o serviço, que pode ocasionar problemas de saúde). Há muito improviso. Equipamentos inadequados, procedimentos potencialmente perigosos que são ignorados. Isso sem contar com a falta de formalização da documentação, o que expõe o empresário a multas.
Por causa do Porto de Itaguaí, há uma grande discussão sobre o pó de minério, que faria mal à saúde dos trabalhadores no local. Qual é sua posição a respeito?
PMG = Para muitos, o problema é a quantidade de particulados, mas é a sílica que faz mal. Há normas reguladoras para a quantidade aceitável de sílica para inalar sem risco à saúde. Tudo depende das especificações e medições. Em alguns casos, o trabalhador tem direito a adicional por insalubridade. Mas o fato é que depende de medição da silícia que compõe o pó de minério.
Depois que a sua empresa fez o evento, houve procura de empresários de Itaguaí interessados na consultoria?
PMG = Sim, as empresas estão nos procurando para regularização, o que é muito bom. Mas tem muita gente que ainda contrata pessoas desqualificadas para executar essas tarefas de segurança do trabalho, o que pode causar ainda mais prejuízo. Já notei que há documentos preenchidos e enviados de forma errada, o que vai causar retrabalho e mais despesas por causa de erros técnicos.
O que há de novidade na área de segurança do trabalho?
PMG = A necessidade de investir em gestão de segurança ficou em evidência por causa do e-social, uma ferramenta que vai transmitir informações das empresas para os órgãos governamentais. Os dados são enviados em uma plataforma, e esta distribui para vários órgãos federais. Hoje não há mais um fiscal que vai de porta em porta. Há uma série de providências a tomar. Há multa por não enviar e por não ter o que enviar, e elas podem ser de R$ 100 mil, a depender da empresa ou da circunstância.
E quanto a pequenos empreendimentos? Um bar, por exemplo, uma barraca de lanches?
PMG = Até uma carrocinha de cachorro-quente deve cumprir as regulamentações, desde que tenha um empregado sob o regime da Consolidações das Leis do Trabalho (CLT). Isso vale para qualquer tipo de negócio, porque o e-social hoje está estritamente previdenciário. Você sendo dono do seu negócio não vai requerer aposentadoria especial, mas o seu funcionário vai.
O quanto ao trabalhador? De que maneira ele deve ficar atento?
PMG = Temos a primeira norma, que exige de todas as empresas a elaboração e a divulgação do Programa de Gerenciamentos de Riscos (PGR), cuja função é mostrar os riscos expostos e planos de ação para amenizá-los ou impedi-los. Além da empresa elaborar, o trabalhador tem que ter acesso a essas informações. Padaria, restaurante, açougue, sorveteria, mercado… todos devem ter esse PGR preparado, finalizado e pronto para consulta de qualquer um. É bom o trabalhador pedir para ver esse documento. Muitos recebem e colocam na gaveta sem nem olhar, mas há planos de ação para serem executados, obrigações, deveres do empregador e do empregado. Não basta o empregador providenciar a documentação, é preciso que o trabalhador exija o cumprimento do plano, até porque ele certamente vai se beneficiar por poder atuar com mais segurança e tranquilidade.
O fator emocional é uma das dimensões da segurança do trabalho?
PMG = Com certeza! O assédio moral é o assunto da Norma Reguladora 5 do Ministério do Trabalho. Um trabalhador com o emocional perturbado está mais sujeito a acidentes. A empresa precisa criar e manter canais de comunicação para que o trabalhador possa relatar essas dificuldades, e, conforme for, contribuir para neutralizá-las.