Escritor premiado mora em Mangaratiba e se prepara para novos voos literários
DIABREU: assim, em letras sempre maiúsculas. Este é o modo como João Paulo de Abreu Costa e Póvoa, escritor de 31 anos e morador de Mangaratiba (na rua Boavista), quer ser conhecido. A cabeça dele fervilhava de ideias, conceitos, possibilidades, fascinações e tantos outros pensamentos que se interpenetram uns nos outros nesta entrevista que ele concedeu com exclusividade ao ATUAL. DIABREU falava de uma pequena cidade (Campestre do Maranhão, a 13 horas de distância de São Luís) porque a sogra, mãe do seu marido, estava adoentada e precisava da ajuda do filho e do genro. Eles prontamente atenderam. Em um intervalo do trabalho e dos afazeres domésticos, o escritor contou bastante da sua agitada vida e dos seus planos futuros na literatura depois de ter recebido um importante prêmio estadual.
Vida agitada, sim. Embora o fascínio pela literatura tenha sido uma constante desde muito cedo, DIABREU se considera escritor de fato recentemente. Antes, ele se embrenhou em atividades muito diferentes entre si, como por exemplo o estudo técnico em eletromecânica, o trabalho no Arsenal de Marinha, o empenho como educador social, o curso de pedagogia na Universidade Rural (UFRRJ) e depois o de Letras/Inglês.
Hoje ele trabalha na Universidade Rural como revisor na editora da instituição, a Edur.
Resumir essa trajetória é correr um imenso risco de fazê-la parecer menor. Mas, a exemplo do modo como quer ver seu nome impresso, seus caminhos e suas impressões mais do que sensíveis são maiúsculas.
Ele acredita que isso se deve, em parte, aos anos em que ele e a família (mãe e irmão, o pai sempre foi ausente, como ele fez questão de enfatizar, com um sonoro palavrão) viveram em Senador Camará, bairro da capital do RJ, na localidade conhecida como “Rebu”. O Rebu de fato era um rebu, para dizer o mínimo. “Eu dormia na cama de cima do beliche, e me lembro muito bem que apenas havia uma telha de amianto que me separava dos helicópteros que sobrevoavam a favela”, conta o escritor.
RECONHECIMENTO
Esse é o motivo pelo qual o seu conto premiado se chama “Do outro lado do amianto”. Ele é um dos 26 selecionados do Prêmio Rio de Contos, uma iniciativa da Mater Produções, com parceria da Fundação de Artes do Estado do Rio de Janeiro (Funarj) e do LER – Salão Carioca do Livro, já na sua terceira edição, que consagra autores de todo o estado do Rio de Janeiro. A peculiaridade deste prêmio é oferecer para os selecionados, além da inclusão em um livro com o conto publicado, workshops e palestras de desenvolvimento da escrita literária.
Aos curiosos, o conto de DIABREU será publicado daqui a algum tempo no livro da terceira edição do Prêmio. Até lá, nada de spoilers, o trabalho fica inédito para não prejudicar a divulgação da obra.
“Fiquei muito surpreso [com o prêmio] porque a minha literatura é meio crua, traz uma violência explícita”, conta o autor. Ele achava que essas características o afastariam de um reconhecimento que, a julgar pelas suas intenções, ainda vai prosperar mais e mais.
Tanto é assim que ele já tem um livro publicado. Isto porque, como aconteceu com alguns seres humanos, o período da pandemia para ele foi produtivo, e, como ele definiu, uma válvula de escape via literatura. Trata-se de “Meu amigo Abaporu”, lançado pelo selo Mundo Contemporâneo Edições, da editora Metanoia. Sinopse: um menino procura pela mãe com a ajuda do Abaporu (sim, do quadro de Tarsila do Amaral) e de um pássaro.
DIABREU diz que sua literatura se enquadra em algum ponto entre a ficção e a fantasia, ou seja, sua expressão é mais livre de amarras da realidade. Porém, o ponto de partida, sem dúvida, é a dura luta pela sobrevivência e pela superação.
A mesma superação que ele ajuda a construir em projetos sociais como “Remição de Pena pela Leitura”, que o levou a frequentar o complexo Gericinó, em Bangu, para despertar o fascínio da arte literária em detentos. Ou sua atuação no Instituto de Formação Humana e Educação Popular, onde o marido foi educador e ele coordenador geral. O Instituto promovia programas que levavam educação gratuitamente para pessoas em situação de vulnerabilidade, como por exemplo o pré-vestibular social, preparatório de candidatos para instituições de excelência.
É fácil perceber o orgulho de DIABREU quando fala dessas experiências, e, neste momento, o homem confunde-se o escritor de uma forma muito peculiar. Mas DIABREU passa mesmo essa impressão: a de que ele é muitos ao mesmo tempo.
“Escrevo para tirar as pessoas da letargia, sou muito politizado, minha escrita é violenta. Tenho necessidade de mudar a realidade violenta das pessoas, e sei que o caminho é a educação”, tenta explicar, mas, obviamente, não consegue. DIABREU unifica tudo em uma energia muito dele, e isso significa que política, favela, educação, amor, busca, palavras, ontem, hoje…tudo é uma mistura cheia de personalidade e fúria construtiva.
Prova disso é a reflexão dele sobre como “sente” Mangaratiba e se ela faz parte do seu universo literário. Ele não descarta a possibilidade de se inspirar nessa linda cidade, mas se perde (ou se acha) em considerações sobre dentro X fora, sobre como a crueza da vida altera o destino das pessoas. Sobre como “Rebu” marca a sua vida e as suas palavras.
PLANOS
Além de voltar a Mangaratiba (onde ele mora há dois anos) quando a sogra estiver boa de saúde, ele pretende se aventurar em um romance de fôlego, com muitas páginas.
Em breve, um outro conto seu será publicado pela revista online chamada “Mafagafo”. É sobre o filho de um burguês que não se conforma com a pouca longevidade do seu cão e faz de tudo para evitar sua morte.
Mas, enquanto o novo livro não sai, ele diz que vai se jogar aqui e ali em um ou outro conto, porque o gênero o agrada bastante. “Gosto de Mangaratiba, conheço como turista, a vida não é tão frenética”, avalia ele. Certamente não como a sua cabeça fervilhante de ideias.