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Dia do Trabalhador: a rotina e o sonho de um autônomo de Itaguaí

Sol forte, chuva, “nãos” e até desaforos. Estas são algumas das agruras que volta e meia marcam o dia a dia de Luiz Carlos há pouco mais de um ano, desde quando decidiu ter como ganha-pão a venda de brigadeiros pelas ruas de Itaguaí – mais precisamente entre o bairro Brisamar, onde mora, e o Centro, onde os negócios costumam render mais.

Às vésperas de mais um Dia do Trabalhador (1º de Maio), o ATUAL conversou com ele, um exemplo clássico de trabalhador brasileiro: atua na informalidade pelas ruas enquanto não realiza o sonho de ganhar dinheiro com o que gosta.

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Sim, o perfil de Luiz Carlos pode ser comum no país. De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Economia e Estatística), por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, 38,9% (ou quase 39 milhões de pessoas) no mercado de trabalho estavam na informalidade no último trimestre de 2022.

Mas quando o itaguaiense de 25 anos – pai do pequeno Theodoro, de 2 anos, e marido da Natasha, a responsável pelos brigadeiros – procurou a reportagem para participar de entrevista para uma outra pauta, o que chamou atenção foi sua iniciativa de inspirar outros a empreender.

Luiz Carlos, ao lado do filho, Theodoro, e da esposa, Natasha (Arquivo pessoal)

Diante de inúmeros obstáculos para se conseguir um trabalho formal – o desemprego cresceu 8,6% na virada de 2022 para 2023, também segundo o IBGE – ele decidiu usar sua conta no Instagram (luiz.vendasnarua) para dar dicas sobre a atividade e contar um pouco de sua trajetória – que inclui passagens pela empresa de perfumaria e cosméticos Hinode (seu primeiro contato com vendas), pela hotelaria e pelo Porto de Itaguaí, onde abriu mão de trabalhar de carteira assinada.

Sim, curiosamente, a história de Luiz Carlos como autônomo na rua não começou por necessidade, mas por opção:

“Percebi que vender na rua pode ser um trampolim para alcançar objetivos”

No “trampolim” em questão, cada “salto” de Luiz é a venda de uma caixinha com quatro brigadeiros por R$ 10. Tudo para alcançar o sonho de abrir um e-commerce (loja virtual) de produtos digitais, como ebooks, podcasts e afins: “Meu maior sonho é viver de Internet”, revela Luiz, que despertou tal desejo durante cursos de marketing digital.

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Porém, mesmo com o futuro negócio, ele não pretende parar de encorajar quem quer – e/ou necessita – empreender no asfalto:

“Para entenderem que as vendas na rua podem ser aquele ‘trampolim’”

Confira a entrevista completa abaixo:

Vendeu apenas brigadeiro neste um ano e pouco?

Luiz Carlos – Depois da Hinode, comecei a vender pastel gourmet, com massa de leite ninho e recheio de Nutella. Mudei para o brigadeiro, passei para minitorta de limão e voltei para o brigadeiro. Vendo uma caixinha com quatro unidades dos sabores beijinho, chocolate tradicional, chocolate granulado tradicional e chocolate granulado gourmet.

Como é a sua rotina?

LC – De segunda a sábado, saio de casa entre meio-dia e 13h e fico na rua até vender tudo. Retorno por volta de 17h. Meu ponto de venda é o Posto do Beto, único posto de gasolina perto da rodoviária. Às vezes, dois dias na semana, vou vendendo para os comerciantes no caminho. Se vender tudo, volto para casa. Senão, vou até o posto. Dá mais ou menos uma hora e 20 minutos de caminhada. 

Trabalhar na rua é obrigatoriamente fruto de uma necessidade?

LC – Para mim, foi opção. Deixei de trabalhar com carteira assinada para empreender na rua. Percebi que vender na rua pode ser um trampolim para alcançar objetivos. Vender na rua pode ser um meio e não o fim.

E que “fim” seria esse?

LC – Talvez, se as coisas se acertarem, a partir de maio, pode ser que eu precise parar com as vendas na rua para iniciar uma nova etapa profissional. Não posso entrar em detalhes, melhor deixar acontecer. Mas essa nova etapa pode me levar ao meu maior sonho, que é viver de Internet, vendendo infoprodutos (produtos digitais).

Um posto de gasolina é o principal ponto onde Luiz Carlos vende os brigadeiros (Arquivo pessoal)

Enquanto não alcança seu sonho, dá para sustentar a família só com os ganhos da rua?

LC – Graças a Deus, sim. A rua possibilita você ter metas. No meu caso, é vender de 30 a 40 caixinhas por dia. E quase sempre consigo.

E quando não consegue?

LC – Falo para mim mesmo que o dia foi bom. Mesmo que não tenha sido (risos). E digo que o dia seguinte será melhor.

Já pensou em desistir?

LC – Algumas vezes. Mas para empreender e alcançar os objetivos é preciso ter constância. Já pensei em desistir, mas entendi que tenho que passar pelo processo para conseguir viver o propósito.

O que te faz não sair de casa para trabalhar?

LC – A única coisa que não me deixa sair de casa para vender é quando eu, meu filho ou minha esposa está doente. De resto, pode cair o mundo de chuva que não deixo de sair.

E como aborda os clientes?

LC – É preciso ter estratégia, mostrar sempre um sorriso no rosto, falar pausadamente, para que as pessoas entendam o que você diz, e saber abordar. Eu sempre pergunto “posso falar com você um minutinho?”. E assim conto minha causa.

E qual é a sua causa?

LC – Usar a Internet para ajudar pessoas a empreender. Quando vendo na rua, digo ao cliente que comprando uma caixinha, vai ajudar quem deseja empreender futuramente.  E mesmo depois que tiver meu negócio de infoprodutos, continuarei incentivando o pessoal, para entenderem que as vendas na rua podem ser aquele “trampolim” para elas também chegarem a outro lugar.

Sim, você falou sobre essa sua iniciativa. E já teve resultado?

LC – Tem o vendedor que conta a sua causa, e tem o que fala sobre uma necessidade. Às vezes, até inventa uma. Um conhecido meu vendia dizendo que precisava pagar a faculdade ou comprar o leite da criança. Conversei com ele, disse que não era assim. Ele mudou a estratégia, e a causa passou a ser vender para abrir uma loja de roupas.

Comerciantes locais também estão entre os clientes do vendedor autônomo (Arquivo pessoal)

Dê três dicas para quem pretende vender na rua.

LC – Ter uma boa causa para contar ao cliente; estar sempre com uma energia boa para contagiar o outro; e não ter medo ou vergonha de falar com clientes.

Muita gente nem tenta por vergonha? Você parece muito à vontade na função…

LC – Para mim, não é fácil, nem confortável. Mas me sinto bem empreendendo. Falam que sou cara de pau (risos). O início foi difícil, mas depois começou a fluir. Tem quem ache vergonha vender água na rua. Comigo não tem isso. Sabendo o quanto posso ganhar, não tenho vergonha mesmo.

Mas mesmo para os “cara de pau” há momentos de desânimo…

LC – Sim, muitas pessoas não são receptivas. Mas isso não me desanima mais. Dou o mesmo sorriso se a pessoa fala “sim” ou “não”. Mas, sim, mesmo com uma abordagem legal, com educação e um sorriso no rosto, tem quem trate mal. Só que não deixo a energia negativa da pessoa passar para mim.

Já passou por alguma situação delicada na rua?

LC – Quando vendia pastel, tinha uma abordagem em que dizia que levava “a felicidade” ao cliente. No caso, o pastel. Mas um dia, um cara falou algo como “felicidade são meus filhos, não um pastel”. Isso no meio do posto. Outra situação foi a seguinte: quando vejo um casal, abordo primeiro o homem, por respeito. Certo dia, ele desceu do carro e foi falar com o frentista. Como não sou de interromper conversa, abordei a esposa. Ele veio reclamar, disse que eu não sabia nem falar, perguntou “como aborda minha mulher assim?”. Desnecessário! Mas nunca briguei por isso. Baixo a cabeça e saio.

E às vésperas de mais um Dia do Trabalhador, qual é a reflexão que você faz?

LC – Sempre falo de sonhos. Se seu sonho é fazer faculdade e trabalhar de carteira assinada, como médico ou engenheiro, não desista. E o mesmo digo para o empreendedor. Os dois caminhos não são fáceis, mas o final é satisfatório e realizador. Vale a pena.

Luiz Maurício Monteiro

Repórter com mais de 15 anos de trajetória e passagens por diferentes editorias, como Cidade, Cultura e Esportes.

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