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Veja como a menopausa pode ser um marco para o recomeço

“Mulher é bicho esquisito, todo mês sangra. Um sexto sentido maior que a razão.” Essas palavras na voz de Rita Lee, na música “Rosa-choque”, marcaram a minha adolescência. Era o tema de abertura do programa TV Mulher, com foco nas questões femininas, que passava todas as manhãs na Globo, no começo dos anos 1980. 

Aprendi a cantar o refrão, “não provoque, é cor-de-rosa-choque”, antes mesmo de “ficar mocinha”, como se dizia na época. Menstruei pela primeira vez aos 13 anos, mais tarde do que minhas amigas. E pela última vez aos 48, mais cedo do que esperava. Até então, a menopausa era algo distante. Só me lembrei que ela existia ao sentir os famosos calores do climatério, uns três anos antes. Acordava no meio da noite encharcada de suor e pensava: “Meu Deus, já?!”.

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A menopausa não é um ponto final

Mãe de uma menina, mesmo sem querer mais engravidar, o fim da fase reprodutiva soava como algo trágico. Não ser mais fértil me assustava. Até porque, na minha geração, hoje chamada lindamente de 50+, a ideia de menopausa ainda remete ao que representava para nossas mães e avós: um ponto final. 

“A menopausa não é o fim, mas um novo capítulo na biografia feminina”, diz Claudia Arruga, 56 anos, juíza e influenciadora, uma das pioneiras do tema no Instagram com o perfil Cool50s. Claudia conta que, ao sentir os primeiros sintomas do climatério, aos 48, ouviu do seu ginecologista: “Bem-vinda, daqui para a frente é ladeira abaixo”. A irritabilidade foi o que mais a afetou, embora também tenha experimentado insônia e ansiedade. Com uma receita inadequada de reposição hormonal, em pleno 2018, ela se deu conta de que poucas pessoas falavam abertamente sobre os sintomas e impactos da menopausa. “Se eu, uma mulher bem-informada, fiquei perdida, imagine aquelas que não têm acesso a nada!” 

Criar um perfil dedicado aos dilemas e delícias da segunda metade da vida foi uma maneira de redefinir esse importante rito de passagem. “A menopausa faz parte da feitiçaria feminina. É a fase mais sábia e livre da vida. Além de não menstruar, não corremos o risco de engravidar, o que é maravilhoso. A baixa de energia significa que você precisa se voltar mais para dentro de si. Cuidamos dos outros a vida inteira, temos os filhos criados, agora é o momento de cuidar de nós mesmas”, diz Claudia, ecoando um anseio feminino nem sempre consciente.

É quando o segundo verso da música de Rita Lee, “um sexto sentido maior que a razão” se sobrepõe ao primeiro. Na linha do tempo da vida de uma mulher, é um período em que, para muitas, as demandas externas começam a diminuir, permitindo maior introspecção. “Você sai da fase reprodutiva para uma fase mais ativa e produtiva, em que vai ‘parir’ a si mesma”, diz a terapeuta Livia Penna Firme Rodrigues, autora do livro + Feliz na Menopausa: Guia para Viver Bem sua Maturescência (Guardiã). 

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“O papel das ‘parteiras da maturidade’ é acolher a mulher na sua transição climatérica e ajudá-la a fazer as melhores escolhas que seu organismo necessita”, explica Livia. A questão espiritual, inclusive, vem à tona nesse momento. Ao mesmo tempo em que se tenta entender as mudanças físicas, emocionais e mentais, muitas delas também desejam explorar os significados simbólicos desse período. “É comum ver mulheres que nunca se conectaram com sua essência espiritual receberem um chamado”, revela a terapeuta.

O que ninguém conta sobre a menopausa

De qualquer maneira, o susto é grande. Aos 40 e poucos anos, a jornalista norte-americana Jancee Dunn começou a enfrentar sintomas aparentemente aleatórios: insônia, boca seca e menstruações mais intensas. Depois de consultar diversos profissionais e fazer mil exames, descobriu que estava na perimenopausa, ou climatério, termo ainda desconhecido por muitas mulheres, que descreve o período pré-menopausa, que pode durar de quatro a oito anos. A menopausa, por sua vez, é confirmada depois de 12 meses sem menstruar.

Romancista best-seller e jornalista de saúde, Jancee ficou surpresa com a escassez de informações disponíveis sobre algo que “acontece com metade da população da Terra”. Essa lacuna a levou a escrever O que Ninguém Conta sobre a Menopausa (Fontanar). Com humor e leveza, ela desmistifica o assunto, apresentando maneiras de viver essa fase de forma realista e saudável. “Evitei no livro usar a palavra sabedoria. Podemos não ser sábias e tudo bem”, brinca ela. Jancee, contudo, enfatiza a importância de consultar especialistas, quebrar o tabu e conversar sobre o tema. Só assim o estigma que cerca essa fase, segundo ela, natural e poderosa, diminuirá.

“Companheiros e companheiras também precisam estar informados”, acrescenta Livia. “A mulher passa por um processo intenso de transformação, pode querer um trabalho novo, viver experiências diferentes ou não aguentar mais a rotina. Ela pode se deprimir, e, quando busca ajuda, muitas vezes recebe remédios para dormir ou para depressão, mas o quadro exige um olhar sobre o desequilíbrio hormonal como um todo”, alerta ela. 

Durante a transição climatérica, além dos sintomas físicos comuns, como insônia, cansaço e dores musculares, é normal ficar irritada com o trabalho, a família, e experimentar uma baixa da libido. Nesse momento, segundo a “parteira da maturidade”, a mulher precisa de acolhimento, compreensão, cuidado e informação de boa qualidade, sobretudo nesses tempos abarrotados de “receitas” de todos os tipos e procedências.

“É importante estar em contato com sua intuição para saber o que precisa, pois somos nossas próprias curadoras, e o que funciona é individual. Não há fórmula mágica, comprimido ou hormônio que seja eficaz para todas.”

Relógio mostrando os números 40,45 e 50 idade que as mulheres costumam entrar na menopausa
A reposição de colágeno na menopausa auxilia a manter o equilíbrio do corpo como um todo (Imagem: ClareM | Shutterstock)

Reposição de coragem e colágeno

Entre as transformações físicas, a pele fica mais sensível, exigindo uma revisão da rotina de cuidados. A dermatologista Ligia Novais explica: “Com as mudanças hormonais que se somam ao envelhecimento cutâneo natural, há uma tendência à flacidez, afinamento e ressecamento da pele”. Felizmente, a tecnologia oferece equipamentos que estimulam o colágeno e ajudam a firmar a cútis. “Não é apenas a pele que precisa do colágeno para se manter saudável. Ele auxilia no equilíbrio do corpo como um todo e contribui para a eficácia dos tratamentos”, justifica. 

Também precisamos falar em prevenção e reposição, um tema delicado. “A reposição hormonal do climatério é diferente da menopausa, pois o ovário ainda produz hormônios de maneira variável”, explica a endocrinologista Ana Priscila Soggia, especialista em saúde feminina. Ela também reconhece que a composição corporal muda, levando à perda de músculos e ganho de gordura, muitas vezes na região abdominal devido à queda do estradiol, que melhora o metabolismo. “Fatores como falta de exercício, aumento da ingestão alimentar e ansiedade contribuem para esse ganho de peso localizado.”

Não tem jeito. É necessário redobrar o autocuidado. “A atividade física, a higiene do sono e a prática de meditação podem ajudar a reduzir a intensidade dos sintomas. No entanto, mesmo fazendo tudo certo, pode ser necessário um suporte com reposição hormonal”, avisa a endocrinologista. Para mulheres que não podem seguir essa via, como as que tiveram câncer de mama, há propostas não hormonais, como aporte de magnésio, acupuntura, medicação para aumentar a serotonina e novas opções terapêuticas.

Na alimentação, incorporar inhame, linhaça, chia e soja pode ajudar, mas suplementos fitoterápicos devem ser usados com cautela e acompanhamento médico. “A menopausa é um momento em que seu corpo pede uma pausa para desacelerar e fazer as mudanças necessárias para se manter saudável. Isso não é ruim, é a falta de suporte que torna essa fase difícil”, afirma a dra. Ana Priscila. 

É necessário mudar a percepção da menopausa

Mudar a percepção social do envelhecimento e da menopausa, para que futuras gerações vejam esse período como um ciclo natural da vida, é algo que todas as especialistas veem como urgente. Jancee Dunn, por exemplo, experimentou alívio significativo dos incômodos e, hoje, valoriza a liberdade de não menstruar mais. Apesar dos sintomas debilitantes que algumas mulheres enfrentam, Claudia Arruga enfatiza que há muitas formas de contorná-los. No seu caso, a reposição hormonal foi benéfica, reduzindo a irritabilidade e aumentando a disposição. Cada uma de nós terá a sua própria experiência. 

O fato é que a linha do tempo continua, e a menopausa é apenas mais uma escala. Sua chegada, mesmo que inesperada, é um convite para abraçar a maturidade com graça e confiança. “É um momento que traz presentes importantes para a vida da mulher, como intuição aguçada, criatividade latente e uma sabedoria interior que já temos, mas ainda não tivemos oportunidade de deixar fluir. Às vezes, mudamos de carreira, recriamos sonhos e vivemos uma vida mais agradável e feliz. Claro, se tivermos acesso à informação e oportunidades”, pontua Livia. E você? Como pretende adentrar esse novo tempo? Já traçou projetos?

Por Rosane Queiroz – revista Vida Simples

É jornalista e cantora. Ganhou uns quilinhos na pós-menopausa. Mesmo assim, considera esta sua fase mais livre e criativa.

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